domingo, 21 de agosto de 2016

Grito Infernal - Parte II



— Grito Infernal.

"... É o meu fim..."

— Chefe Grito Infernal?
"... acabe com isso..."

Grommash Grito Infernal abriu os olhos. Sua tenda estava vazia, como sempre, mas seu braço estava esticado sobre a esteira de pele de animal, tentando abraçar alguém que jamais se deitaria ali de novo. Como sempre.

De fora da tenda, outra vez: — Chefe Grito Infernal?
Ele grunhiu e relaxou. A voz não tinha vindo dos seus sonhos, afinal. — Entre — disse ele.

Um armoreiro do Brado Guerreiro entrou. — Chefe, o saqueador Riglo me insultou. Nós queremos resolver isso no mak'rogahn.



Grommash piscou, afastando o sono dos olhos. — Vocês lutaram ontem à noite — disse ele.

— Contra outros. Mas ele duvidou da minha honra, e eu vou provar o erro dele. Nunca mais ele vai falar que…

O orc continuou falando. Os minutos se passaram.

Grommash esfregou a testa e interrompeu finalmente. — Muito bem. Vocês podem lutar. Quando o sol se pôr... — Ele olhou para fora da tenda. A noite já tinha caído. Ele dormira o dia todo. — Não, vão se preparar agora. Não comecem até eu chegar.

— Sim, Chefe Grito Infernal. — O armoreiro partiu.

Esse é o problema com a paz,Grommash pensou. Muitos membros do Brado Guerreiro não tinham nascido no clã. Tinham se unido ao estandarte de Grito Infernal em busca de guerra e glória, e por algum tempo, tinham encontrado. Agora os inimigos tinham sido derrotados. Mesmo os clãs órquicos rivais andavam lentos nas empreitadas de guerra, graças a Gul'dan e seus avisos sobre uma ameaça vinda de fora. Até que os clãs decidissem como combater essa ameaça, não havia nada contra o que lutar. Alguns tinham problemas para ocupar o tempo.

Mak'Rogahn. Não era para ser usado em disputas levianas. Grommash deu um longo suspiro e se ergueu, afivelando as manoplas.

— Tolos — sussurrou ele, e se arrependeu imediatamente. Eles não eram tolos. Não mais do que ele era. Ele compreendia o caos sereno da paz, a maneira como o passado podia se impor a uma mente ociosa. Remorsos podiam fazer adoecer a vontade de um guerreiro, se durassem muito tempo. "Remorsos são fraquezas", Grommash repetiu para si mesmo. Não havia espaço no Brado Guerreiro para fraquezas, nem mesmo no coração do chefe do clã. Até o prazer modesto de assistir uma luta sem importância serviria para espairecer sua mente.

“... me dê a morte de guerreiro que eu mereço..."

Uivo Sangrento, o machado da linhagem Grito Infernal, jazia perto da esteira. Já fazia algum tempo que ele não bebia sangue, e não era provável que o fizesse naquela noite. Grito Infernal o pegou assim mesmo e atravessou o acampamento até o fosso de combate. Uma multidão já se aglomerara ali — não todo o clã, claro. Apenas uma mísera fração deles havia retornado da temporada de caça, e poucos se importariam com o que acontecia no fosso. Mas ainda assim havia gente o bastante para cercar a beirada e bloquear a visão de Grommash até que ele chegasse ao assento do chefe. O armoreiro e o mestre de lobos já estavam no fundo do fosso, prontos para lutar. Eles o saudaram.

A multidão ficou em silêncio. — Normalmente algumas palavras são proferidas antes do início da peleja, mas vocês já as ouviram antes — disse Grommash, permitindo certa agressividade na voz. — Só os que têm vontade de ferro podem se chamar Brado Guerreiro...

"... não vê que é tarde demais?..."

A voz de Grito Infernal tornou-se um grunhido. — Mas vocês provaram seu valor antes. Provem novamente. Comecem!

Os dois orcs avançaram, golpeando, agarrando, torcendo e arranhando.

A multidão rugiu e bateu as armas, alto o bastante para sufocar a outra voz, a que apenas o chefe podia ouvir, e que gritava em suas memórias.

Grommash sentou-se e cruzou os braços, depondo o machado sobre o colo. Alguns minutos depois, o mestre de lobos acertou a têmpora do armoreiro com um soco forte e a luta acabou. O vencedor passeou pelo fosso, adorando a adulação que recebia da massa. O outro ficou inconsciente no chão.

No fim das contas, nada fora do comum. Mas eles ficaram à altura do estandarte  do Brado Guerreiro. — Boa luta. Sem rendição. Honra ao mestre de lobos pela vitória, e honra ao armoreiro por lutar até o fim — disse Grommash. — Bebam com fartura hoje. Vocês dois provaram que têm o coração do Brado Guerreiro. "E acho que já é a oitava vez em duas semanas".

Dois orcs ergueram o armoreiro do fosso e deram tapinhas em seu rosto até ele acordar, grogue mas apascentado. Daquela vez não havia membros quebrados pra consertar.

A multidão ficou por ali, ansiosa por outro confronto. Grommash concordou. Uma luta não bastava para aquietar o passado.

Grommash ergueu o punho e a multidão se voltou para encará-lo. — Alguém mais? — perguntou ele? — Quem mais vai mostrar seu coração é do Brado Guerreiro?
Vários na multidão ergueram ambas as mãos, gritando para chamar a atenção de Grommash. Um orc saiu empurrando com os ombros, abriu caminho e pulou no fosso. — Eu vou! — gritou ele.

Grommash sorriu. "Os outros pedem. Ele age."O chefe não conseguiu se lembrar de imediato do nome do orc. As poucas tochas no fosso não forneciam luz suficiente. Grommash apertou os olhos, perscrutando aquele rosto. Estranho. Havia algo familiar ali, mas o nome não vinha.

Sussurros desconfiados correram pela multidão.

"Quem é aquele?"

Ninguém sabia. Os murmúrios se espalharam.

Algo estava errado. Grommash se inclinou para diante e ficou olhando. Havia muita coisa errada ali. Grilhões atavam os pulsos do estranho orc. O corte e o tecido das roupas dele não pareciam com nada que Grommash já tivesse visto. A mancha escura que cobria seu queixo não era uma barba incipiente, mas uma tatuagem — tatuagem de chefe, incrivelmente elaborada.

A multidão mexeu-se, inquieta. Logo o silêncio caiu sobre o acampamento Brado Guerreiro, e os orcs armados levaram as mãos ao cabo das armas. O orc postava-se alto e orgulhoso no fosso, parecendo gostar da confusão que causara, exibindo um leve sorriso.

Grommash baixou a mão para o cabo de Uivo Sangrento. Ele aprendera a confiar em sua voz interior, e agora ela gritava que aquele orc era perigoso, um forasteiro que não pertencia àquele lugar. Um assassino? Caso positivo, era então um assassino ousado, ou estúpido, para entrar de pulsos atados em um fosso cercado por membros armados do Brado Guerreiro.

A expectativa de violência dominou a mente de Grommash. Fazia tempo desde que seu machado bebera sangue.

Mas aquela mesma voz interior... atiçou sua curiosidade. Por que ele parece tão familiar?— Então seu coração é do Brado Guerreiro? — perguntou Grommash.

— Sim, é — disse o orc, com voz forte, falando para a multidão tanto quanto para Grommash.

— Diga o seu nome.

O orc ergueu o queixo. — Eu venho até vocês como um estranho, apenas isso.

Grommash estudou o orc em silêncio por algum tempo. — Você não tem clã, estranho? Não tem linhagem? Seu nome não é louvado nas histórias de vitória na guerra? Ele demonstrou algum desprezo e a multidão riu nervosamente.

— Histórias são palavras, e palavras são vento — disse o estranho. — Só as ações dão testemunho do que vai no coração.

— Mas até uma história pequena pode responder certas questões. — Grommash gesticulou para os grilhões do estranho. — Que clã você enfureceu para merecer tal tratamento? E quando você escapou? Há algum exército atrás de você, estranho, se preparando para invadir meu acampamento? — Ele se virou para a multidão e não tentou esconder sua raiva. — E como ele entrou aqui? Quem é o responsável por vigiar hoje à noite, que preferiu viu assistir à luta? Apareça! — O rugido alto ecoou pelas fileiras de tendas. A multidão já não ria.

Quatro orcs avançaram até a beira do fosso, e o silêncio tornava ensurdecedor o som dos seus passos hesitantes. Seus rostos evidenciavam sua preocupação, mas eles mantiveram a cabeça erguida e se identificaram pelo nome. Grommash deixou que ficassem esperando em pé até gotas de suor aflorarem em suas testas.

— Um coração do Brado Guerreiro não significa nada se o cérebro for de ogro — disse ele, calmamente. — Vocês permitiram que esse orc se infiltrasse aqui. A justiça requer que vocês compartilhem do destino dele, qualquer que seja. vocês concordam?
Eles murmuraram: — Sim, Chefe Grito Infernal.

Grommash falou em um tom baixo. — Então juntem-se a ele. — Eles hesitaram mas pularam no fosso sem protestar. O estranho recuou para dar espaço. Eles o olharam com ódio. Ele os encarou sem piscar.

— Estranho. Você não tem clã? — perguntou Grommash.

— Como eu disse, meu coração é do Brado Guerreiro. Mas eu não tenho clã — disse ele.

Grommash esfregou o queixo. — É por isso que você tem essas marcas? Você não tem clã... então você é o seu próprio chefe?
A multidão riu outra vez. O estranho não sorriu. — É uma marca de outra época. Uma cicatriz. Nada mais.

— Os membros do Brado Guerreiro não respondem com charadas e evasivas, estranho, e você não é bom nisso — retorquiu Grommash. — Me responda claramente. O que você veio fazer aqui?
O estranho sorriu. — Você é a segunda pessoa a me dizer isso hoje. — Ele baixou a cabeça por um instante e se concentrou. Quando ergueu o rosto, o sorriso tinha sumido. No lugar, apenas convicção absoluta. — Grommash Grito Infernal, eu vim de muito longe e sacrifiquei muita coisa para me postar aqui diante de você. Eu estou aqui para impedir o destino que aguarda você e todos os outros orcs.

— Que é...?
— Escravidão. A perda de nossas almas e tudo o que nos dá nossa grandeza — disse o estranho, peremptório.

A multidão olhou para Grommash, buscando sua reação. Ele não os fez esperar muito.

Ele riu. Alto e forte. A tensão sumiu e todos os membros do Brado Guerreiro riram com ele. Até os orcs no fosso riram. Só o estranho permaneceu impassivo. "E eu achava que ele era perigoso"pensou Grommash. Quando a onda de hilaridade passou, Grommash se ergueu, segurando displicentemente Uivo Sangrento.

— Muita gente iria querer sua cabeça por essas palavras, estranho. Já eu não vejo honra em matar lunáticos — disse Grommash. Ele disse aos orcs amuados no fosso: — Levem-no à tenda do ferreiro. Livrem-no das correntes, dêem-lhe comida e um odre de água, e depois escoltem-no para fora daqui. Vocês não serão punidos. — Os orcs relaxaram. — Talvez a culpa não seja toda de vocês. Se tivessem visto o estranho, talvez o tivessem matado, e os espíritos protegem os tolos. Mandem-no embora e aprendam a lição. Não quero mais deslizes.

Os quatro orcs no fosso se aproximaram do estranho. — Você acha que estou mentindo? — disse o orc, recuando.

— Não — respondeu Grommash, gentilmente. — Acho que sua mente está debilitada. O Brado Guerreiro não se rende. Para nós, a escravidão é o únicodestino que nunca enfrentaremos. Mesmo na derrota, mesmo capturados, nós resistimos até a morte.

Um dos guardas no fosso agarrou o braço do estranho. O orc agrilhoado firmou os pés, entrelaçou os dedos e golpeou. Seus punhos bateram no queixo do guarda, derrubando-o. Os outros partiram pra cima.

— Parem! — gritou Grommash. Eles pararam. — Você testa minha paciência, estranho. A misericórdia do Brado Guerreiro não vai muito longe, mesmo para lunáticos.

O estranho não recuou. — A escravidão do Brado Guerreiro não resultará da guerra ou da derrota. Vocês aceitarão seu destino de boa vontade, e felizes — disse ele, erguendo a voz — e você,Grommash Grito Infernal, será o primeiro a aceitar o jugo dos novos mestres dos orcs. O resto irá segui-lo. Nós nunca nos recuperaremos.

Aquelas palavras foram recebidas com um silêncio completo. Ouvia-se apenas o leve rumor da brisa passando pelas tendas e o crepitar das tochas ao redor do fosso.

Os últimos resquícios de piedade de Grommash sumiram. — Suas profecias são absurdas. E agora você insultou minha honra. — Sua expressão se endureceu. — Mas como você disse, palavras são vento. Só as ações importam. Você conhece o mak'rogahn, estranho?
O orc agrilhoado inclinou a cabeça e moveu a boca, repetindo as palavras sem fazer som. Duelo de vontades. — Eu conheço o mak'gora. Conheço muito bem. Isso é muito diferente? — perguntou ele.

— O Mak'Gora é uma luta até a morte — disse Grommash. — O Mak'Rogahn é como o Brado Guerreiro mostra seu valor. Eles entram no fosso e lutam, e só param quando caem. Não há rendição nem piedade. Só uma exibição da vontade de sobreviver a qualquer obstáculo e suportar qualquer dor. Os que desistem são exilados. É assimque alguém prova que seu coração é do Brado Guerreiro. Nosso clã nunca mais vai tolerar a fraqueza.

— Nunca mais? — perguntou o estranho.

"...me dê a morte de guerreiro que eu mereço..."

Grommash ignorou a lembrança. — Se suas palavras são verdadeiras, lute. Mostre-nos sua honra.

O estranho olhou para as mãos atadas por um instante. — Eu aceito.

— Excelente. O Mak'Rogahn não é uma luta até a morte, mas acidentes acontecem — disse Grommash. — Você não apenas me insultou, como insultou todo o Brado Guerreiro. Talvez vocês quatro queiram defender nossa honra.

— Nós aceitamos! — rugiram eles de volta, sem hesitar. Os olhos do estranho se abriram um pouco mais.

— Comecem — disse Grommash, reclinando-se no assento.

Eles começaram.

Continua...




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